Da Folha de São Paulo:
A USP (Universidade de São Paulo) deu um salto e aparece entre as 70 instituições de ensino superior com melhor reputação no mundo, segundo ranking do THE (Times Higher Education) publicado em Londres. (…)
A maior parte da nota de cada universidade no ranking geral do THE, que costuma ser divulgado em outubro de cada ano, vem de critérios como a quantidade de citações recebidas pelos artigos dos docentes -o que é chamado de indicador de “impacto da pesquisa”.
Esse item vale 30% da nota recebida por cada universidade -quase o dobro da reputação acadêmica (18%). (…)
Nesse quesito, a USP vai bem: a universidade está em 20º lugar na listagem de universidades com mais visibilidade na internet, divulgada em fevereiro pela Webmetrics, empresa que analisa o tráfego na rede.
Em primeiro lugar, é excelente ver universidades brasileiras bem conceituadas internacionalmente; ainda mais quando esta é a universidade em que você se graduou e pela qual tem uma paixão e gratidão eternas. Mas não é sobre isto que eu quero falar neste texto.
O Brasil viveu nos últimos 20 anos uma multiplicação no número de universidades, faculdades e centros de ensino superior. Segundo Fernando Haddad, apenas entre 2000 e 2010 o número de estudantes universitários saltou de 3 para 6,5 milhões.
Por mais que muitos (como o governo) vejam isto como algo positivo, é preciso levar várias coisas em conta. Mesmo que este aumento tivesse se dado apenas em faculdades de alto nível de qualidade, a vantagem para a sociedade e mesmo para os estudantes seria relativa, mas sabemos que nem isto é verdade.
Muitas das novas faculdades e universidades que se espalharam pelo Brasil são fraquíssimas, meras “vendedoras de diplomas”. Os professores fingem que ensinam e geram pesquisa, os estudantes fingem que aprendem e todos ficam satisfeitos. Nem todos. Quando estes estudantes forem ao mercado de trabalho, serão esperados deles conhecimentos que eles não terão. Aí, os empregadores ficarão descontentes e, provavelmente, rebaixarão as expectativas quanto a graduados naquelas universidades/faculdades. Eles procurarão apenas os profissionais graduados nas universidades mais conceituadas, e gera-se um fosso entre uns e outros.
Na prática, isto já acontece. E o dinheiro e tempo investidos na educação serão completamente desmerecidos. É uma enganação em termos estatísticos. A proporção de brasileiros com diploma aumenta, mas isto não se exprime no mundo profissional. Soa bonito na propaganda eleitoral, mas não auxilia o desenvolvimento econômico e social brasileiro.
Também é um choque de realidade ao sonho de ensino superior. E estes indivíduos não encontrarão um lugar no mercado de trabalho. Isto se soma à cada vez mais clara falta de técnicos no Brasil. São poucas as instituições de formação técnica, para execução de atividades específicas. Este treinamento, em muitos casos, é promovido dentro das próprias empresas, mais por falta de profissionais qualificados no mercado que por boa vontade dos empresários. E mais um peso se soma aos já onerosos custos trabalhistas do país.
O Brasil vive uma ilusão de ensino superior. De democratização ao acesso. Mas enquanto não se colocar o pé no chão, cobrar qualidade das universidades e faculdades já existentes e melhorar a formação de técnicos, o desenvolvimento econômico do país estará limitado pela deficiência da mão de obra.
Usar o fator de impacto de pesquisa também é complicado….isso implica que a produção científica do corpo docente é boa, mas nem sempre isso reflete qualidade de ensino e coerencia. Na verdade muitos dos professores só estão interessados em sua pesquisa e só dão aula porque são obrigados…daí da para se imaginar a qualidade das disciplinas. Isso não seria um problema em países onde o ensino básico é forte, já que o papel do professor é apenas “guiar” o aluno. Agora, aqui no Brasil é necessário que os professores ministrem aulas mesmo, para “tapar os buracos” de um ensino de base deficiente.
Não sei se é o caso da USP, mas em instituições menores isso é bem comum…
De fato, Raisa, há muitas instituições em que os professores estão mais interessados na pesquisa acadêmica que na qualidade de ensino. Outro problema grave do Brasil é a falta de Centros de Pesquisa exclusivos. Os professores das grandes universidades são obrigados a ministrar um mínimo de horas por semana por semestre, e alguns fazem-no por pura obrigação mesmo.
Se houvesse grandes Centros de Pesquisa, isto não seria necessário.
Outro ponto é a disparidade de realidades entre os cursos de uma mesma instituição. Em alguns casos, como o próprio reitor da USP colocou, pela fama (ou má fama) de uns cursos, outros são “colocados no mesmo saco”.