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A visita de Sua Santidade e a celebração da hipocrisia

Em um momento em que a população brasilera parece ter saído de quase duas décadas de inércia, é tempo de circo novamente. Não há lugar onde não se vejam notícias sobre o Papa. A mídia, recentemente convertida ao Catolicismo Romano, acompanha-o vorazmente. Transmissões ao vivo de cada passo, respiração, tosse e piscar de seus olhos, acompanhados de gritos histéricos dos fiéis, impõem-se sobre todas as televisões e jornais. Somos um país abençoado, vivificado, pela presença do Sumo Pontífice!— o elo entre Deus e a Terra.

Parece um relato um tanto amargo, irônico e o é. O nosso país é ainda uma exceção num mundo — ocidental — cada vez menos religioso. A fé é legítima, inerente ao ser humano, parte integrante dele. A crença particular é indiferente, pois o que importa, em termos práticos, para a sociedade e para o próprio indivíduo, são seus preceitos, atitudes e valores, para com si e para com o próximo. Contudo, não se defende o materialismo aqui. Einstein disse que a fé sem a Ciência é cega — outrossim, a Ciência sem a fé é manca.  Critica-se a idolatria a uma pessoa, cuja infalibilidade é registrada no Direito Canônico: a própria palavra de “Deus“ feita carne. A voz do Santo Papa é a voz da Santa Igreja.

O Sr. Jorge Mario Bergoglio definitivamente rompe com o padrão de seu antecessor, aproxima-se de João Paulo II e torna-se uma figura renovadora dentro da Igreja. Tem suas raízes na América do Sul, humilde, extremamente carismático e prega valores beneditinos — além de demonstrá-los enfaticamente. Parece tender a compreender o mundo de forma mais moderna. Realmente foi uma boa escolha em tempos comos estes.

Porém, o Papa, seu cargo divino, é a figura aqui digna de vaias, líder da uma instituição falida — exceto pelo seu trono de ouro, com licença — que contribui para a estagnação, senão o retrocesso da humanidade. Na incessante luta por direitos humanos, sua postura institucional misógina, patriarcal, machista e homofóbica pouco mudou nas últimos séculos. As mulheres continuam sendo vistas como inferiores, submissas aos homens, privadas de direitos — como a escolha de métodos contraceptivos. Houve tempos em que nem podiam ser educadas formalmente. Muitas foram queimadas por prepararem chás — “poções” — com propriedade analgésicas para aliviar o parto durante a Idade Média. Verdadeiras bruxas. Creio que não seja necessário retomar a triste história da humanidade nestes últimos milênios.

O mundo é abalado pela epidemia do HIV/AIDS. Na África está o grande bolsão da tragédia, com o maior número de contaminados. Cerca de 15% da população da África do Sul possuem o vírus, sendo a maioria mulheres. Apesar dos inúmeros esforços da Organização Mundial de Saúde, tanto para a distribuição maciça de preservativos, educação sexual e oferta de tratamento antirretroviral, a Igreja contribui diretamente para esta mazela, pois proíbe o uso de preservativo entre seus fieis. Afinal, os filhos são as graças de Deus e, se temos nossas pragas, nós nos havemos condenado pela nossa própria licenciosidade. Os seres humanos copulam somente para fins reprodutivos. Planejamento familiar não existe dentro da Igreja Romana.

Os participantes da Jornada Mundial da Juventude receberam uma cartilha oficial com diversas posições dogmáticas eclesiásticas. Nela, reforçam-se posições arcaicas e bizarras, discorridas na sequência: Deus criou macho e fêmea, como descrito no Gênese. Homossexuais são abominações, claro, como sempre nos lembra Levítico. Chega-se ao absurdo pseudocientífico de se afirmar que a contracepção de emergência seria abortiva (mesmo os contraceptivos hormonais orais — as pílulas), assim como o DIU — dispositivo intrauterino. Filhos gerados por reprodução assistida seriam artificiais e sua qualidade e fiabilidade como “produto” (aspas não minhas) poderia ser questionada. Eutanásia e dignidade humana são confundidas de tal forma a se propagar a ideia de perpetuação de um sofrimento até a morte natural.

O surgimento da pílula em 1960 representa um dos maiores impactos históricos e sociais na emancipação das mulheres, sua independência da vida do lar, inserção no mercado de trabalho e inflamação do movimento feminista. Em 1978 nasce Louise Brown, o primeiro “bebê de proveta”, fruto da fertilização in vitro, devolvendo o sonho da paternidade a milhares de casais até então considerados inférteis. A aprovação do AZT, a zidovudina, primeiro fármaco antirretroviral, marca o primeiro passo na guerra contra o HIV. Em 1996 ocorre consolidação da trincheira com o advento da terapia antirretroviral combinada, o famoso coquetel. Desde de 2001 e até então, 16 países legalizaram o casamento homoafetivo, reconhecendo o direito à felicidade de inúmeros seres humanos, desde os tempos da Antiguidade Clássica perseguidos.

Num momento em que o controle populacional, o impedimento da propagação do HIV, o planejamento de vida, a conquista de direitos humanos e a evolução social se impõem irreversivelmente, o obscurantismo medieval da Igreja tenta prevalecer, e pior, luta contra a humanidade. Brinda-se à ignorância e à hipocrisia, em um mundo com os olhos no futuro, todavia com a mente no passado.

*Texto escrito pelo Dr. Breno Godoy.

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Finalmente uma boa notícia: o número de pessoas famintas no mundo caiu

O numero de pessoas que passam fome no mundo caiu nos últimos anos. Mas ainda é muito alto.

Segundo o mais novo relatório da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), em 2012, cerca de 870 milhões de pessoas passam fome, 132 milhões a menos que em 1990-2.

Enquanto o mundo consegue reduzir seus índices de miséria, a fome ainda cresce na África

A grande maioria dos que sofrem de fome, 852 milhões, vivem em países em desenvolvimento – cerca de 15 por cento da sua população –, enquanto 16 milhões de pessoas subnutridas se encontram nos países desenvolvidos. (…)

O número de pessoas com fome crónica caiu mais acentuadamente entre 1990 e 2007 do que se acreditava anteriormente. Desde 2007-2008, no entanto, o progresso global na redução da fome diminuiu e estabilizou.

“No mundo de hoje, com oportunidades técnicas e económicas sem precedentes, consideramos totalmente inaceitável que mais de 100 milhões de crianças menores de cinco anos tenham peso insuficiente e não possam portanto, alcançar o seu potencial humano e socioeconómico, e que a subnutrição infantil seja a causa de morte de mais de 2,5 milhões de crianças por ano”, afirmam no prefácio do relatório José Graziano da Silva, Kanayo F. Nwanze e Ertharin Primo, Responsáveis da FAO, FIDA e PAM, respectivamente.

“Observamos com especial preocupação que a recuperação da economia mundial desde a recente crise financeira global permanece frágil. No entanto, apelamos à comunidade internacional para que faça esforços extras para ajudar os mais pobres na realização do seu direito humano básico a uma alimentação adequada. O mundo tem o conhecimento e os meios para eliminar todas as formas de insegurança alimentar e de subnutrição”, acrescentam. É necessária uma “dupla” abordagem, com base no apoio a um crescimento económico inclusivo (também na agricultura) e a redes de segurança para os mais vulneráveis.

Brasil registra avanços

Pelos dados do relatório, o Brasil conseguiu reduzir de 14,9%, no período de 1990 a 1992, para 6,9%, nos anos de 2010 a 2012, o percentual de subnutridos. No país, cerca de 13 milhões de pessoas passam fome ou sofrem com desnutrição. Os programas sociais desenvolvidos pelo governo brasileiro em parceria com os governos estaduais e municipais, além da iniciativa privada, foram elogiados no documento.

O Programa Bolsa Família é uma referência, segundo o relatório. Para os especialistas, o Bolsa Família é um instrumento positivo para promover a capacitação econômica das comunidades. Há elogios também ao sistema adotado pela prefeitura de Belo Horizonte (Minas Gerais) de combate à fome na periferia da cidade. (…)

A Ásia lidera em número de pessoas com fome; a fome aumenta na África

No que diz respeito a regiões, a subnutrição nas últimas duas décadas diminuiu quase 30 por cento na Ásia e no Pacífico, de 739 milhões para 563 milhões, em grande parte devido ao progresso socioeconómico de muitos países da região. Apesar do crescimento da população, a prevalência da subnutrição na região caiu de 23,7 por cento para 13,9 por cento. A região da América Latina e Caribe também fez progressos, passando de 65 milhões de pessoas com fome em 1990-1992 para 49 milhões em 2010-2012, ao mesmo tempo que a prevalência da subnutrição caiu de 14,6 por cento para 8,3 por cento. Mas o ritmo do progresso abrandou recentemente.

A África foi a única região onde o número de pessoas com fome aumentou neste período, de 175 milhões para 239 milhões, com quase 20 milhões de pessoas a mais nos últimos quatro anos. A prevalência da fome, embora tenha reduzido durante todo o período, aumentou ligeiramente ao longo dos últimos três anos, passando de 22,6 por cento para 22,9 por cento – com mais de uma em cada quatro pessoas a passarem fome. E na África subsaariana, o modesto progresso alcançado nos últimos anos até 2007 foi revertido, com um aumento de 2 por cento da fome por ano desde então.

As regiões desenvolvidas também viram o número de pessoas com fome a aumentar, de 13 milhões de pessoas em 2004-2006 para 16 milhões em 2010-2012, revertendo uma diminuição constante em anos anteriores em relação aos 20 milhões de pessoas estimados em 1990-1992.

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