Não foi por falta de aviso. Nem por falta de histórico.
As crises do petróleo escancararam o déficit em conta corrente brasileiro nas décadas de 1970 e 80, e a solução final veio apenas com o plano real, suas elevadíssimas taxas de juros e empréstimos com o FMI para evitar um novo calote da dívida.
Durante a última década, o Brasil surfou uma onda de elevação dos preços das commodities (produtos básicos, como soja, milho e minério de ferro) e não teve de se preocupar com sua conta corrente.
A forte entrada de investimentos e os superávits na balança comercial (exportações maiores que as importações) fizeram com que a conta corrente fosse assunto de livros de história.
Porém, isso começou a se inverter com o estopim da crise do sub-prime americano em 2008 e desde então vem se agravando. Com o sucateamento da indústria brasileira, importamos mais e mais produtos industrializados. Mas ainda exportávamos muita soja e ferro, e estava tudo bem. Mas o cenário pode se inverter de vez – e isso pode deteriorar fortemente o cenário econômico nacional.
Da Folha:
A possibilidade de que a desaceleração na China e a retomada dos EUA ocorram em ritmo mais forte do que o previsto representa um risco para o Brasil.
As duas maiores economias do mundo caminham em direções opostas.
Se esse descasamento se acelerar rapidamente, o Brasil poderá se deparar com dificuldades para financiar o crescente rombo em suas contas com o exterior, que chegou a 3% do PIB (Produto Interno Bruto).
Uma fraqueza mais acentuada da China levaria a uma desaceleração maior das exportações brasileiras, podendo provocar um maior deficit em conta-corrente.
Esse saldo negativo nas transações do país com o exterior precisa ser financiado com recursos externos.
Nos últimos cinco anos de deficit, os investimentos estrangeiros diretos cobriram os buracos. Em 2013, essa situação mudou. O país voltou a depender de recursos mais voláteis, como investimentos em ações e renda fixa.
A expectativa de analistas para a entrada desses fluxos no Brasil em 2013 é boa.
A possível pedra no caminho pode ser uma recuperação mais rápida dos EUA.
Isso levaria parte desses recursos a sair de mercados emergentes e migrar para ativos americanos, principalmente em um possível cenário de alta de juros nos EUA.
Reservas de US$ 375 bilhões ajudariam a conter uma desvalorização do real.
Mas, segundo o economista Affonso Celso Pastore, a tendência seria de uma “correção contracionista” no Brasil, ou seja, com impacto negativo sobre a atividade:
“Se houver restrição de capital quando os Estados Unidos começarem a retirar liquidez do mercado, o câmbio no Brasil sofrerá um ajuste”, disse Pastore durante seminário da EMTA (Emerging Markets Trade Association) na última quinta-feira.
Uma desvalorização mais forte do real pressionaria a inflação, que está próxima ao teto da meta, de 6,5% (o centro da meta é 4,5%).
Isso poderia forçar o Banco Central a aumentar mais os juros, freando o crescimento bruscamente.
O renomado economista Mansueto Almeida não crê que isso seja grave no momento, mas alerta para os riscos no longo prazo:
O problema agora é que começamos a voltar para um déficit em conta corrente elevado, sem perspectiva de redução nos próximos anos. Se de fato a taxa de investimento começa a crescer e caminhar ao longo dos próximos anos para romper a barreira dos 20% do PIB, o déficit em conta corrente vai se aprofundar ainda mais e, possivelmente, vamos romper a barreira dos 4% do PIB novamente.
O pior de tudo isso é que o Brasil ainda é uma economia muito fechada e já estamos com um déficit em conta corrente elevado. Dado o nosso histórico, isso preocupa, até porque um país que cresce com o uso elevado de poupança externa tem câmbio valorizado, algo que o governo e indústria não querem.
Estamos na iminência de uma crise do setor externo? De maneira alguma. Estamos longe disso. O problema é que para crescer mais rápido vamos precisar, cada vez mais, da ajuda do resto do mundo. Uma estratégia que tem riscos no longo prazo e um modelo que implica uma moeda mais valorizada. Esse é um novo problema para o próximo governo.
Se você não entendeu, tudo isso pode contribuir para desacelerar ainda mais o crescimento da economia brasileira nos próximos anos e elevar a inflação. Uma combinação nada agradável que os Brasileiros acima d0s 30 anos lembram bem.
E agora, Dilma?